Três organizações não-governamentais de renome internacional uniram-se numa ação judicial contra o Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos (EXIM), acusando a instituição de ter aprovado ilegalmente um financiamento de 4,7 mil milhões de dólares norte-americanos para o controverso projeto de gás natural liquefeito (GNL) em Cabo Delgado, Moçambique.
As organizações Friends of the Earth U.S., Justiça Ambiental/Friends of the Earth Moçambique e EarthRights International entraram com a acção no tribunal federal distrital do Distrito de Columbia, contestando a legalidade da decisão do EXIM. Segundo os autores do processo, a aprovação do financiamento violou tanto as normas internas do banco quanto leis federais dos EUA, ao ser concedida sem avaliações ambientais e económicas adequadas, sem a participação pública obrigatória e sem a aprovação do Congresso.
O projeto de GNL, liderado pela TotalEnergies, multinacional francesa, tem sido alvo de fortes críticas devido às alegações de violações dos direitos humanos, deslocamentos forçados de comunidades, destruição ambiental e associação com conflitos armados em Cabo Delgado. Desde 2021, a própria TotalEnergies declarou “força maior” e suspendeu as operações, devido à intensificação da violência armada na região.
Ainda assim, em março de 2025, um conselho de administração “interino” do EXIM – nomeado semanas antes pelo presidente Donald Trump sem a devida confirmação do Senado – aprovou o massivo empréstimo em apoio ao empreendimento.
Posição das ONGs
A Justiça Ambiental/Friends of the Earth Moçambique, organização que tem acompanhado de perto os impactos do projeto sobre as comunidades locais, foi categórica:
“Continuar a financiar projectos de gás em Cabo Delgado seria uma traição a Moçambique e à humanidade”, declarou o porta-voz da organização.
“Seria uma falta de respeito pela justiça que é devida às pessoas que sofreram violações dos direitos humanos. Seria ignorar as vozes das famílias que estão a suportar os fardos mais pesados – que perderam as suas terras, o acesso ao mar e os seus meios de subsistência. Seria uma falta de compromisso com as leis nacionais, as normas internacionais e quaisquer esforços para lidar com a crise climática. O GNL em Moçambique beneficiaria apenas as empresas de combustíveis fósseis e uma pequena elite política.”
A Friends of the Earth U.S., sediada em Washington, acusou diretamente o EXIM de operar fora da lei e desperdiçar dinheiro público em projetos de risco:
“Existem procedimentos e processos legais em vigor para garantir que o Banco de Exportação e Importação dos EUA não desperdice o dinheiro dos contribuintes em projectos arriscados, afectados por insurreições violentas”, afirmou Kate DeAngelis, diretora adjunta de Política Económica da organização.
“No entanto, o EXIM – tal como o resto da Administração Trump – acredita que pode operar fora da lei. Não ficaremos de braços cruzados enquanto a Administração Trump corta os cuidados de saúde e a ajuda em caso de catástrofes para poder dar esmolas às empresas de combustíveis fósseis.
Já a EarthRights International, que representa as ONGs no tribunal, considera que a decisão do EXIM é imprudente e juridicamente inválida:
“A decisão ilegal do Conselho de Administração do EXIM de subsidiar este projecto, sem sequer considerar os riscos para a população local, para não falar das graves alegações de que a segurança do projecto cometeu um massacre no local do projecto, é mais do que imprudente”, afirmou Richard Herz, da EarthRights.
“A EXIM precisa de fazer o seu trabalho e considerar realmente os danos que este projecto irá causar à população local.”
A acção movida pelas três ONGs tem como objetivo anular a aprovação ilegal do financiamento, impedir o desembolso dos fundos e obrigar o EXIM a respeitar os requisitos legais estabelecidos pelo Congresso. Os requerentes alegam que a decisão do banco viola não apenas as normas processuais, mas também limites substantivos impostos por lei, constituindo um precedente perigoso para futuras operações.
Se for bem-sucedida, a ação judicial poderá travar o avanço do financiamento norte-americano ao projeto da TotalEnergies, considerado um dos maiores investimentos em gás em África, mas que vem sendo associado a conflitos armados, deslocamentos forçados e impacto ambiental devastador. (Comuncado/MRTV)

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